20.8.09

[Review] - Como um show do Arcade Fire mudou minha vida

por Bruno Cobalchini Mattos

Poucas pessoas se dão conta quando estão passando da pré-adolescência para aquilo que é considerado o início da maturidade, mas eu sei o momento exato em que aconteceu comigo. Foi em 26 de outubro de 2005, por volta da meia noite e meia. Quando tinha saído de casa, na tarde do dia anterior, meu objetivo era assistir aos Strokes. Mas acabei abandonando meu lugar na platéia (excelente, quase junto à grade) poucos minutos depois de eles subirem no palco. Os motivos? O empurra-empurra era desumano, e diversas pessoas desmaiavam por falta de ar. Achei que seria melhor acompanhar o resto da apresentação lá do fundo. Mas o que decidiu mesmo foi a certeza de que já tinha visto o melhor show da noite.

Quando foi anunciado que os Strokes iriam tocar em Porto Alegre, nenhum dos meus amigos deu atenção pro Arcade Fire, banda que tocaria antes dos norte-americanos e sobre a qual nada sabíamos. Foi melhor assim. Se tivesse acontecido de outro jeito a experiência não teria sido tão incrível. Naquela noite, quando os canadenses encheram o palco (encheram mesmo, eram oito ou nove!), tudo era novidade: o ‘feeling’ do vocalista, as trocas de instrumentos entre os integrantes de uma música para outra, os capacetes utilizados como instrumento de percussão, a mulher de voz linda que cantava em francês. Tudo era deliciosamente inesperado.

Lá pelo meio do show, fiquei um pouco sem jeito de não ter procurado saber quem eles eram antes daquele dia. Se tinha uma banda que merecia a minha atenção era aquela. Mas o meu mal-estar durou pouco: foi logo sublimado por uma maré de vergonha alheia. Boa parte dos (outros) pré-adolescentes imbecis (sim, eu já era um pouco arrogante) que foram lá pra ver o Strokes estava vaiando, pedindo o fim do show sob gritos de “Enough!” para que os garotos nova-iorquinos pudessem entrar em cena mais cedo.

Porra, como assim? Não sei se me irritou mais a falta de respeito deles ou a incapacidade de entender o que estavam vendo. Aquela não era uma banda qualquer! É claro que, depois disso, rolou um mal-estar grande entre os fãs do Arcade Fire (“as pessoas com mais de 15 anos”, como apontou de forma brilhante algum blog no dia seguinte) e a galerinha do Strokes. Não deu em nada mais grave, mas ficamos sem bis. Uma pena.

Apesar do pessoal que resmungava daquela banda que nunca tinham visto na tevê, a oportunidade foi ótima para que aqueles de cabeça mais aberta conhecessem uma das bandas com melhor presença de palco que existem e curtissem junto. Teve desde o Win Butler choramingando enquanto cantava uma versão de ‘Aquarela do Brasil’ até alguns membros da banda subindo nas paredes do lugar (que é um antigo galpão de fábrica adaptado para shows) e se atirando na platéia sem parar de tocar no meio tempo. E o show do Strokes? Foi legalzinho, mas técnico demais. Até o “feedback” era igual ao do disco. Na verdade, me marcou tão pouco que nem lembro de muita coisa.

A partir daquele dia, o salto de Strokes pra Arcade Fire me proporcionou diversas descobertas. A primeira delas foi perceber que as bandas mais interessantes não eram necessariamente as que tocavam nas rádios daqui – e que a Internet era a melhor maneira de encontrá-las. Aprendi também que era possível ser fã de uma banda sem deixar de ter senso crítico. Um exemplo? Quando o ‘Neon Bible’ (segundo disco do Arcade Fire) vazou na Internet, em fevereiro de 2007, eu estava na praia. Fui até o centro da cidade de ônibus só pra comprar um cd virgem, baixar ele numa lan house e fazer uma cópia pra escutar antes do lançamento. E, mesmo assim, a primeira coisa que eu fiz depois de ouvir ele foi uma lista com os pontos fracos da produção (sem entrar em minúcias, podiam aumentar o volume dos pianos em algumas músicas). Foram quase dois anos de insistência até que eu finalmente reconhecesse que sim, aquele era um disco tão válido artisticamente quanto seu antecessor.

Mas o mais importante foi perceber minha estupidez ao pensar que a boa música tinha acabado nos anos 1970 (vale lembrar que o Strokes, apesar de contemporânea, é uma banda de marcante influência sessentista). O Arcade Fire foi a minha ponte entre os Beatles e aquilo que é produzido nos dias de hoje, um dos passos mais importantes na minha formação musical. É claro que, com o tempo, conheci trocentas outras coisas, e notei que a banda canadense era uma entre tantas outras maravilhosas que existiam por aí (eu amadurecia, afinal, e reconhecia que não podia saber tudo). Mas nada muda o fato de que, naqueles últimos meses de 2005, o Arcade Fire foi pra mim a melhor banda do mundo; sentimento que, ainda hoje, resgato em parte ao escutar o ‘Funeral’, primeiro álbum deles.


Ah, e é claro, o Arcade Fire me livrou da vergonha de ter que defender aquela merda do ‘First Impressions of Earth’.

9 comentários:

  1. meu velho, estive no show e faço de tuas palavras as minhas, com a diferença de que não demorei nada pra perceber a genialidade do album neon bible. uma pena que tu demoraste, é genial e em muitos quesitos supera SIM o também genial funeral.

    se é que ainda não ouviu, perca algum tempo ouvindo o EP e todas outras músicas deles. por mais que não fosse um viciadinho em strokes ou coisa parecida, aquele show me fez praticamente parar de ouvir outras bandas que não mostrassem alguma pitada de genialidade, alguma coisa que as diferenciasse das outras ou coisa parecida.

    valeu, desculpa o grande comentário. provavelmente não retonarei a seu blog pois não tenho costume de ficar revisitando. mas tu parece um cara inteligente e desejo sorte para esse seu espaço.

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  2. Expressou muito bem o sentimento de ter ido naquela noite linda para ver os Strokes e ter se surpreendido com um superador show do Arcade Fire. Foi realmente melhor. E ter o prazer de conhecer a banda depois também - great feeling. A melhor coisa talvez tenha sido toda a abertura que o AF te trouxe, no caso. Conhecer e gostar de coisas novas só vale! Texto lindo. Tudo é lindo, to caetano ;P

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  3. só descobri o arcade fire depois dos comentários cheios de exclamação sobre o show, uma pena. perdi o show do arcade fire porque strokes não chamava muito a minha atenção, que mancada do destino comigo, huhu. Mas o importante é que passei por essa fase de começar por uma banda escondidinha até chegar a outras várias através da internet. Adoro arcade fire, embora já faça tempo que não seja mais minha banda preferida, haha. Mas é sempre válido abandonar os conceitos idosos, ainda mais quando falamos de música, onde tudo se cria e se transforma eternamente.

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  4. Vida longa ao Arcade Fire!
    Kra esse show foi demais, lembro que a única coisa que dava pra fazer para acompanhar era bater palmas no ritmo da música, não lembro de ter visto nenhuma alma naquele dia que realmente conhecia as letras, mas dava pra ver a surpresa do público e a animação que o show trazia.
    Com certeza foi uma puta experiência, sem dúvidas uma das melhores bandas em atividade.
    Esperando anciosamente pelo sucessor do Neon Bible.

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  5. perfeito o texto.
    eu só conheci o arcade depois do show que eles fizeram aqui, e eu nunca vi nada igual, mudou minha vida mesmo. não dá pra comparar com nada.
    eu já até tentei escrever sobre, mas não consegui me expressar muito bem. sabe aquele sentimento bom de quando você ouve uma música fantástica pela primeira vez? é assim sempre que escuto arcade.

    esperando ansiosamente pelo sucessor de neon bible.

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  6. bom, assim como a Débora, eu também só descobri Arcade Fire depois que amigos me falaram do show que superou os Strokes - não gostava dessa banda e nunca pagaria para ver um show.

    Acho Funeral um dos melhores discos dessa década que está acabando. Um dos três, digamos. E a impressão que tive quando ouvi foi a mesma tua: não, a música não acabou nos anos 70, etc.

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  7. incrível!! depois de 4 anos venho fuçar em algo q falasse sobre aquele histórico show de 2005 em Poa! Como milhares ,fui pra ver o strokes,com minha namorada da época(hje n estamos mais juntos) mas até hje concordamos q foi uma experiência sobrenatural!!! Momento q mudou minha vida!!!! Por favor.....quem n conhece,procure conhecer esta banda

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  8. Não conheço Arcade Fire, mas tenho paixão por bandas canadenses. Pelo seu relato tô inso baixar agora, muito bom o texto, tá de parabéns!

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  9. ahaaaaa!!!
    Sabe qual é o pior?
    Passarem-se 5 anos e seus amigos que não deram a mínima para a banda que vc gostou (Arcade Fire é só mais um exemplo =) começarem a ouví-la compulsivamente jurando uma fidelidade xiita em relação àquela banda.
    ¬¬ (rsrs)

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